FIBROMIALGIA – palavra que eu conhecia de nome, mas que estava
longe de saber o que representava para quem convive com isto para o resto da vida.
Como técnica de saúde, sabia em traços gerais que havia uma sensação de fadiga
constante, de dor mais ou menos presente e sabia que estava directamente ligada
ao sistema nervoso central. Ponto! O próprio conceito de “dor crónica” para
mim, era qualquer coisa de exacerbado. Quem, na sua limitação humana seria
capaz de suportar dores constantes, 24 sobre 24 horas? Pois…
As pessoas que conhecia serem portadoras de FM eram pessoas que aos meus
olhos eram emocionalmente frágeis e sensíveis, logo, achava (mal) que era também uma forma de chamar
a atenção ou de justificar a sua pouca vontade de reagir perante as
adversidades.
Logo, quando a médica olhou para mim e disse que eu devia ter Fibromialgia,
a minha primeira reação foi achar que ELA é que não estava bem. Como é que EU
poderia ter Fibromialgia? Eu, que não sou nada dada a dramas e a achaques? Eu,
que sempre fui lutadora e me considerei autónoma, independente e perfeitamente
consciente do que sentia? Eu, que sempre achei que a nossa mente controla as
nossas emoções, o nosso corpo, a nossa saúde?
Demorei uns segundos a processar, mas como em tudo o que faço, “depois do
mal estar feito, é preciso viver em função de….” Para mim, depois daquele
atordoamento inicial, ter este diagnóstico (ou
outro qualquer que englobasse todos os sintomas que eu tinha até então)
acabou por ser um alívio. Os últimos 20 anos foram marcados por sintomas
isolados (perturbações do sono, dores
musculares e articulares, perturbações do aparelho urinário e intestinal, etc)
e nesse momento tudo fez algum sentido. Ou foi essa a forma que o meu subconsciente
encontrou para me tranquilizar.
PONTOS DE VISTA
Depois do diagnóstico, pesquisei (e
continuo a pesquisar) tudo o que diz respeito a esta nova amiga, tanto em
termos de sintomas como de experiências com terapias alternativas, assim como
acompanhar estudos feitos na compreensão desta síndroma…claro, sempre com a
esperança de encontrar uma luz ao fundo do túnel, uma solução que possa tornar
a nossa vida mais simples e mais leve.
No dia do diagnóstico, saí do consultório com o cardápio das drogas
clinicamente autorizadas para enfrentar este desafio. Cardápio esse que segui
pouco tempo, pois os efeitos secundários sobrepuseram-se largamente aos
benefícios. Claro que há sempre quem diga que, se não faço medicação “pesada”,
é porque não estou suficientemente doente…Ok, ainda bem então!
Como em tudo na vida, tento sempre ver o copo meio cheio em vez de lamentar
o copo meio vazio. Inicialmente, aderi a vários grupos e páginas ligadas à FM e
assumo que foi muito bom. Senti que afinal, não estava sozinha, e que o que
sentia, afinal até fazia sentido, NESTE contexto. Eu pensava que o que sentia
até ao diagnóstico, não se iria alterar, mas até nisso eu me enganei. Estão
sempre a aparecer novos sintomas, novas situações com as quais temos que lidar
e adaptar o meio exterior em função do que acontece dentro de nós.
Continuo a pensar que a nossa postura perante a vida, é meio caminho andado
para ajudar a processar melhor esta treta toda e foi por essa razão que criei a
página com o mesmo nome e posteriormente o blog. Não digo nada de novo, apenas
me recuso a entregar-me a “ela” como se fosse o fim do mundo. Claro que tenho
dores. Claro que tenho dias desesperantes em que apetece ficar na minha bolha e
não ouvir nada nem ninguém. Mas também tenho outros em que sem saber como nem porquê,
tudo tem outra cor, outro cheiro, e a vida parece normal.
Incomoda-me ver publicações dramáticas onde as pessoas parece que se esgrimem
para ver quem se sente pior, para ver quem toma mais medicamentos, quem se
sente mais incompreendida por quem os rodeia. E nos dias em que eu já não estou
muito bem, ver comentários desse tipo deixa-me perplexa (estou a ser educada!) Obviamente que não é fácil viver com isto,
mas gaita, ainda temos algum controle sobre as nossas emoções, ou não? Será
assim tão difícil ver que mesmo assim, ainda temos momentos bons? Será que
essas pessoas só têm momentos maus? 24 horas sobre 24?
Sim, tenho uma personalidade forte (para
os mais cépticos, será certamente mau feitio), mas acredito piamente que se
nos debruçarmos demasiado tempo sobre o que temos de pior nas nossas vidas, não
nos damos espaço para valorizar os momentos que realmente importam. Tal como a
minha terapeuta de psicomotricidade sugeriu, quando eu orgulhosamente lhe
contei que fazia um diário com tudo o que sentia, dores que tinha, medicação
que fazia, passei a tomar também nota dos momentos bons que tinha durante o
dia. Mesmo que fosse só meia hora a ver um programa que me interessasse, ou 15
minutos a ouvir a minha filha contar-me o seu dia quando chegava a casa. Mas
era importante valorizar todos os pequenos momentos felizes do dia a dia, mesmo
que sejam 5 minutos, mas eram a esses que eu precisava de me agarrar e de
valorizar.
Os momentos leves ou felizes são os que realmente importam pois são esses
que nos definem como pessoa e que reflectem aquilo que somos. Pensar nos
momentos de dor e estar sempre a pensar no que me dói e há quanto tempo me dói
e nas outras limitações que tenho, é entregar-me à doença. E isso jamais o
farei. Bem basta eu ter que lhe dar algumas tréguas quando já não dou uma para a
caixa, mas é só temporariamente, até eu recuperar forças e voltar a ser “eu”.
Claro que não é fácil viver com isto. Perdi muita da minha espontaneidade,
no sentido em que tudo o que faço, passou a ser perfeitamente racionalizado.
Quando saio para as compras, tenho que levar tudo perfeitamente programado, de
modo a não ser demasiado exigente para mim. Quando faço alguma coisa em casa,
tenho que dosear tudo muito bem em termos de tempo e de esforço e descanso. E
isso sim, é tremendamente desgastante. Não impossível, mas desgastante.
Não é fácil, para alguém como eu, estar por exemplo, a fazer uns biscoitos
com a filha, e a meio ter de parar e ter me deitar 15 minutos até “recarregar
as pilhas”. Ou depois de fazer uma refeição, estar sentada à mesa e não
aguentar uma refeição normal sentada e ter de me deitar. Ou estar sentada à
mesa e não conseguir sequer cortar a carne (de
perú ou frango) e assumir que precisa de ajuda. Ou ainda, andar na rua a
passear e de repente, precisar de me segurar porque tudo começou a andar á
roda. Não é nada fácil, mas prefiro pensar que há coisas piores.
Apesar dos muitos momentos cinzentos, ainda tenho uma vida pela frente e muitos
momentos bons para viver. Tenho uma filha maravilhosa que me apoia e entende,
tenho pessoas que me são próximas que me compreendem e respeitam e em função
disto, considero-me apesar de tudo, uma pessoa afortunada. Por eles mas
sobretudo por mim, tenho o dever e o direito de viver o melhor que posso e que
sei com todas estas mudanças, boas e menos boas. Eu não sou a doença, eu sou
EU!